É muito comum os casais pedirem para realizarmos a transferência de mais de um embrião. Muitas são as razões que passam pela cabeça desse casal…
Alguns acreditam que isso pode aumentar as chances de engravidar e uma barriga de bebês “múltiplos” supriria em dobro o tempo da tão sonhada gravidez e seria uma “única” barriga, completando de vez a prole daquele casal. Mas será que transferir mais embriões aumenta minha chance de gravidez e é seguro?
Fisiologicamente, a mulher é programada para ovulação mono folicular, com a liberação de 1 único óvulo por mês, desenvolvimento de um feto e posterior amamentação de um único neonato. Consequentemente, gestações múltiplas ultrapassam a capacidade uterina de nutrir adequadamente os fetos. Modelos em humanos e animais têm repetidamente demonstrado a relação recíproca entre peso ao nascer e idade gestacional no parto e o peso dos bebês. Como resultado da capacidade uterina limitada, uma redução natural no número de fetos é visto com frequência. Em estágios iniciais, o embrião pode desaparecer (“vanishing twin síndrome”), evento que ocorre em uma a cada 6 a 7 gestações gemelares geradas pelos tratamentos de reprodução assistida.
Em um passado não muito distante, o número de embriões a serem transferidos podia exceder o número de 4, se assim o casal desejasse. Com isso, a incidência de gestações múltiplas era elevado, o que antes poderia ser comemorado como um sucesso para o casal e para a clínica. No entanto, essa conduta repercutia no aumento das intercorrências obstétricas como partos prematuros, bebês abaixo do peso que necessitavam de hospitalização por meses em Unidade de Terapia Intensiva Neonatal, morte prematura, resultando em custos hospitalares, trauma, frustração e muita dor para os casais.
A gravidez múltipla aumenta os riscos tanto para mãe como para o feto, e são eles: parto prematuro, baixo peso ao nascer, pré eclâmpsia, diabetes gestacional, entre outros, riscos esses que são exacerbados em mães com idade mais avançada. Portanto, a gestação gemelar não é uma meta a ser alcançada, mas uma complicação a ser evitada, considerando todos esses riscos para a saúde da mãe e do bebê.
Com o intuito de assegurar a saúde da paciente e sua prole, entidades como ASRM (SOCIEDADE AMERICANA DE MEDICINA REPRODUTIVA, ESHRE (SOCIEDADE EUROPÉIA DE REPRODUÇÃO HUMANA), SBRA (Sociedade Brasileira de Reprodução Assistida) e CFM (CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA) passaram a transmitir mais informações e dados para diminuir o número de transferências de mais de 2 embriões.
A nova Resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) n. 2.294, de 27 de maio de 2021, reduziu o limite anterior de 4 embriões e estipula que o número de embriões a serem transferidos de acordo com a idade será a seguinte a partir de maio desse ano: a) mulheres com até 37 anos: até 2 embriões , b) mulheres com mais de 37 anos: até 03 embriões, c) em caso de embriões euplóides ao diagnóstico genético: até 02 embriões, independente da idade) nas situações de doação de ovócitos, considera-se a idade da doadora no momento de sua coleta. De acordo com o CFM, em caso de gravidez múltipla, decorrente do uso de técnicas de reprodução assistida, é proibida a utilização de procedimentos que visem a redução embrionária.
As técnicas de laboratório evoluíram consideravelmente nos últimos anos, considerando os avanços na criopreservação de embriões, na extensão do cultivo embrionário até blastocisto, desenvolvimento de meios de cultura específicos, caminhando lado a lado, observamos a evolução da Genética Reprodutiva, permitindo a seleção do melhor embrião (euplóide) a ser transferido através do teste genético pré-implantacional (conhecido como PGT-A). Com essa nova ferramenta diagnóstica, a utilização da transferência de embrião único demonstrou uma redução nas gestações múltiplas e melhora nos resultados neonatais sem comprometer as taxas de nascidos vivos.
Outro ponto que devemos considerar são as taxas cumulativas de gravidez após mais de uma transferência embrionária. Se transferirmos os únicos 2 embriões euploides obtidos em um ciclo de fertilização in vitro, caso não haja sucesso nessa primeira tentativa, poderemos perder uma segunda chance, com a nova possibilidade de 50 a 60% de gravidez.
A era das taxas baixas de nascidos vivos e das transferências múltiplas embrionárias de rotina está cada vez mais no passado. A transferência de um único embrião, ou Single Embryo Transfer (SET), tem se tornado uma tendência mundial e, já é uma realidade em muitos centros de reprodução humana, com o objetivo de minimizar os riscos envolvidos na gestação gemelar e aumentar as chances de implantação embrionária transferindo o blastocisto de melhor qualidade.
Em direção a medicina reprodutiva moderna, orientamos de rotina a SET como melhor escolha, pois envolve maior segurança e menores riscos, permitindo que alcancemos nosso objetivo de mãe e bebê saudáveis em casa.