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Parte I

Se você tenta engravidar há mais de um ano e:

– Já buscou vários médicos que não são especialistas;
– Tomou chás e remédios milagrosos com promessas de ficar grávida;
– Fez barganhas, cultos, simpatias e apelou para um Deus que acredita;
– Pesquisou em vários sites, redes sociais e comparou seu caso com outros vistos;
– Percebeu que todos a sua volta estão engravidando, menos você;
– Até sentiu uma pontinha de raiva e ciúmes ao receber a notícia de alguém que engravidou;
– Quase todos os amigos têm filhos, os pais querem ser avós e os irmãos querem ser tios, e você sente a cobrança social como um peso enorme sob seus ombros;
– Parou sua vida profissional e social somente para ir em busca desse desejo, que é ter um filho…

Então, se identificou com alguns desses itens? Pois é, o desejo de ter um filho é cercado por diversos fatores: sociobiológico, econômico, psicológico e social sendo a infertilidade um estressor para esse casal, o que interfere na construção do imaginário de uma “família ideal”.

Acompanhamento psicológico

Na busca da concepção, o casal vivencia experiências que os afeta financeiramente, fisicamente e emocionalmente. Considerando o ser humano como um todo, corpo e mente, o acolhimento se faz necessário nesse processo. Após iniciar tratamento em uma clínica de medicina reprodutiva, o acompanhamento psicológico auxilia na elaboração dos sintomas produzidos pela ansiedade, angústia e tensão que podem aparecer. Entendendo que cada caso é um caso e cada indivíduo é singular.

Porque é importante?

O tratamento de reprodução assistida demanda tempo. Lidar com o tempo se torna cada vez mais difícil, já que se vive em um mundo imediatista, o qual a maioria das respostas ocorre muito rapidamente. Entretanto, o início desse processo demanda investigações, exames e avaliação do médico especialista. E, como primeiro impacto, o resultado da causa de infertilidade. Logo, os pacientes precisam de um tempo para a elaboração da perda da fertilidade, entendendo essa avalanche de sentimentos que surgem. Às vezes, inclusive, trazendo à tona marcas de uma cultura que carregam na história de vida: “toda mulher precisa ter filhos” ou “o homem tem que provar sua virilidade tendo filhos”.

Como é isso para você? O que vai fazer com isso agora? O acompanhamento psicológico deveria iniciar nessa fase:

– Auxiliando esses pacientes nessa elaboração;
– Abrindo espaço para essa escuta; reduzindo o nível de ansiedade e frustração; 
– Fortalecendo o casal;
– Melhorando a comunicação com a equipe clínica;
– Amparando nas escolhas que fizerem.

Todos pacientes precisam desse acompanhamento?

Todos deveriam se beneficiar desse acompanhamento, porém esta é uma decisão pessoal. Alguns não se sentem à vontade em um primeiro momento ou nunca falaram com um psicólogo e ficam constrangidos. Outros reconhecem a importância do suporte e usufruem de forma positiva desse benefício. E há aqueles que resolvem procurar esse auxílio após determinada tentativa, a qual o resultado não foi o esperado ou satisfatório, pela ausência da resposta ovariana, pela falta de espermatozoides e embriões ou ainda em razão do doloroso Bhcg negativo.

Porque o desejo de ter filhos é tão avassalador?

A maternidade está vinculada ao corpo e à reprodução? Pode-se estar grávida e não ter o filho na sua inscrição simbólica. Pode-se não ter filhos e ser mãe do mundo. Pode-se desejar estar grávida e não querer ser mãe. A maternidade ultrapassa a biologia, a procriação e a gestação.

Logo, o desejo de ter um filho adquire diversos sentidos para diferentes mulheres, e para algumas esse desejo é avassalador. Querer ser mãe testemunharia uma exigência feroz? Encontramos nos discursos de nossas pacientes como é doloroso para uma mulher não conseguir se deixar levar pela alegria de ter um filho e não sentir na maternidade uma manifestação de amor por seu filho.

A ausência do laço amoroso é sentida como uma falta, uma culpa e uma angústia intensa. Mas, um filho vem para tamponar essa falta? Perpetuar a espécie? Responder a cobranças sociais? Para a construção de família ideal? Compreende-se que, em nossa época, a maternidade/paternidade consiste em uma das possibilidades de escolha para a mulher/homem e não seu destino natural.

* Colaborou como fonte neste texto a psicóloga Valéria Teixeira, da Perfetto.

Parte II

Psicologia Perinatal

A Psicologia Perinatal cuida dos aspectos psicológicos no período que antecede a gestação e no ciclo gravídico-puerperal. Passando pelo cuidado ao luto perinatal tanto para mãe e para o pai, quanto para a família. Nos casos de infertilidade e reprodução assistida, atende os casais nos diversos desafios, sobretudo no que diz respeito à elaboração de alguns lutos.

Lutos da infertilidade

Alguns casais tendem a enfrentar dificuldades na decisão por um filho, culminando muitas vezes na resolução por tratamentos de reprodução assistida, o que costuma trazer repercussões psicoemocionais.

Luto do casal infértil, como lidar com esse diagnóstico?

Lidar com a infertilidade traz muitas angústias ao casal, sobretudo porque até então a possibilidade de gestação parecia no controle de ambos. Deparar-se com o diagnóstico requer a elaboração de um luto simbólico, importante para clareza e tomada de decisão sobre quais alternativas ou tratamentos buscar para realização do sonho pelo filho.

Ovorecepção e impactos psicológicos

Receber um filho através da ovorecepção costuma ser uma decisão entrecortada de muitos lutos. Abrir mão das características pessoais, ou seja, do DNA costuma ser ponto de muita angústia, dúvidas e incertezas. O acompanhamento psicológico é muito importante neste período.

Elaboração dos lutos para receber um filho através da ovodoação

Um dos momentos mais dramáticos vividos por um casal e em particular pela mulher é diante do resultado negativo ou impossibilidade de engravidar com seus óvulos. Muitos sentimentos se misturam à dor de não poder ter filhos com seu DNA. Porém, é preciso viver o luto de um filho idealizado com suas características e preparar lugar para a chegada do filho possível, através da doação de outra mulher.

Luto do filho idealizado e chegada do filho real

Todos nós somos frutos do desejo dos nossos pais. Assim, todo filho antes de nascer já existe nas fantasias, sonhos e desejos das mães. E não tem problema nenhum nisso. Imaginar como ele ou ela será, aparência, personalidade, faz parte da construção do vínculo. Mas, no momento do nascimento há o encontro com o filho real, e é neste filho que o investimento afetivo precisa ser direcionado.

Luto perinatal

É o luto vivido por mães ou pais que perderam seus bebês no período gestacional ou neonatal. Costuma ser um luto complicado, por não ser reconhecido socialmente. O acompanhamento psicológico facilita a expressão dos sentimentos, trazendo conforto e possibilitando novas adaptações à vida e ressignificados.

Dor silenciosa ou silenciada

A dor do luto perinatal é uma dor silenciada. O que a mãe e o pai perdem por não ter visibilidade social costuma ser negligenciado e, assim, o convite à viverem essa dor sozinhos, de forma silenciosa, costuma trazer consequências para a saúde mental de ambos.

Apojadura e luto perinatal

Apojadura trata-se da descida do leite materno e, sendo a amamentação um símbolo da maternidade, muitas mães que perdem seus bebês passam a vivenciar um sofrimento maior, diante, muitas vezes, da chegada do leite sem seu filho para alimentar. Muitos médicos já prescrevem remédio para suprimir essa chegada. Mas, essa é uma situação que amplia a tão intensa dor pelo luto gestacional.

Elaboração do luto e a chegada do bebê arco-íris

Bebê arco-íris é o nome dado ao bebê que chega após a perda gestacional ou neonatal. Traz colorido à vida de muitos pais que passaram pela dor da perda. Contudo, é importante que os pais passem pelo processo da elaboração do luto do filho que morreu antes de investir emocionalmente no novo bebê.

A despedida do filho permite enfrentar o luto de forma saudável

Nos casos de perdas neonatais, muitas instituições de saúde não estimulam alguns rituais importantes para a primeira tarefa do luto que é a aceitação. Das práticas mais importantes nesses caso, destaco: perguntar se a mãe quer segurar seu bebê, informá-la sobre suas condições, permitir que ela escolha uma roupinha, que tire uma foto. Despedir-se do filho legitima a perda e dá início a um processo de luto.

Terapia do luto

O luto é uma reação normal diante de perdas, sejam elas concretas, como a morte, ou simbólicas, como a perda de um emprego ou classe social. O processo do luto é singular, não podendo, portanto, ser mensurado. A dor da perda será vivida individualmente. O luto não é doença. Assim, nem todos que passam por ele precisarão de cuidados psicológicos. Todavia, se os sintomas do luto persistirem, atrapalhando a vida do enlutado, impedindo sua adaptação, é preciso buscar ajuda.

Processo do luto

A perda é o processo que ocorre após a morte, e o luto é a experiência pessoal diante dela. Para ajudar a pessoa que passa por uma perda, é preciso compreender qual sua experiência diante disso, além de entender o vínculo com a pessoa falecida. O luto é uma vivência singular e solitária. As reações diante da ausência serão vividas de formas diferentes pelos diversos indivíduos com as quais a pessoa falecida convivia.

Fases do luto

As fases do luto compreendidas como negação, raiva, barganha, depressão e aceitação não acontecem de forma linear ou cronológica. O luto é algo singular e nem sempre a pessoa enlutada passará por todas essas fases, sendo que alguns nem chegam a vivenciá-las.

Tipos de luto

O luto é um fenômeno mental, natural e pode ser identificado por alguns tipos que facilitam a compreensão psíquica e emocional do enlutado. Principalmente para rastreio de adoecimentos em decorrência dele, ainda que se compreenda que luto não é doença. Os principais são o luto antecipatório, normal, complicado, adiado e não autorizado.

Luto materno em tempos de pandemia

Se uma mãe que passa por uma perda gestacional ou neonatal muitas vezes costuma não encontrar espaço social para falar ou vivenciar seu luto, em tempos de pandemia, onde o isolamento social impera isso, costuma ser muito mais difícil. Assim, é importante que a família ou rede de apoio dessa mulher fiquem atentos, oportunizando acolhimento e espaço de fala para que o luto não caminhe para uma depressão ou outros transtornos psíquicos mais graves.

Luto ou depressão

A linha entre um e outro pode parecer tênue. Porém, é importante classificá-las para que haja cuidados adequados para um e outro. O luto é uma reação emocional normal diante de perdas simbólicas ou reais. Em casos particulares e sob avaliação de um profissional da saúde mental, ele pode incorrer para uma depressão.

A depressão é doença, caracterizada como um transtorno mental e pode ser leve, moderada ou grave. Assim, como o luto é caracterizado por tristeza persistente, falta de energia e perda de interesse por coisas antes prazerosas, é importante ter um diagnóstico médico para tratamento adequado.

* Colaborou como fonte neste texto a psicóloga perinatal Sandra Moura, da Espaço Maetamorfose, e terapeuta do luto, da clínica Seamme.